Entre as causas que espertaram o animo e brio dos portuguezes para se abalançarem á empreza dos descobrimentos, podem apontar-se como principaes: o desejo de dilatar a fé christã em todo o mundo conhecido; a sêde de gloria e de renome; a ambição de grangear fortuna conduzindo para o reino as especiarias, o ouro e pedras preciosas em que abundam as regiões orientaes; e a curiosidade de desvendar os segredos da natureza n'aquellas remotissimas paragens. E não se julgue que as navegações do seculo XV foram iniciadas sem plano, sem destino. Pelo contrario. Os nossos intrepidos mareantes levavam a sua rota já marcada, e não levantavam ferro sem se aperceberem de todos os conhecimentos e apparelhos necessarios ao cosmographo. A cultura intellectual do povo portuguez attingira o grau de desenvolvimento bastante grande para acompanhar o movimento scientifico e litterario das mais adiantadas nações da Europa, e com as suas viagens n'aquella época teve principio a historia verdadeira das navegações ao longo da Africa. Até ali tudo é vago, indeciso, fabuloso. Portugal estava mais proximo, que nenhum outro povo, do litoral africano; tinha já tomado Ceuta; dobrara o cabo Bojador; e sabia, em virtude da passagem do cabo da Boa Esperança, que existia communicação entre o Atlantico e o mar das Indias. Por tudo isto nutria no peito a generosa aspiração de levar o nome da patria e do filho de Maria aos paizes em que nasce a aurora. Tal era o desejo, a vontade nacional. Ora, sempre que um povo nutre uma idéa grandiosa, surge de entre a multidão um grande homem, o qual é—porque assim digamos—a personalisação do sentimento popular. Esse grande homem, esse representante da vontade unica de todos os portuguezes foi Vasco da Gama. Affirmam os chronistas que elle nasceu em Sines, e que teve por paes a Estevão da Gama e Isabel Sodré; e ainda que pouco escrevam, d'onde possamos inferir como correra a sua infancia e puericia, é comtudo facil presumir que principiou a sua carreira nos mares da Africa, e que sendo encarregado de negocios importantes, d'elles se desempenhou a contento do seu rei. A biographia de Vasco da Gama só é clara quando el-rei D. Manuel o escolheu para levar a cabo a empreza que sonhara. O facto de haver sido eleito pelo monarcha afortunado bem mostra que o Gama era navegante experimentado, e de animo feito e capaz de grandes cousas. E assim acontecia. Entre as qualidades que lhe adornavam o espirito, avultavam a energia com que exercia o mando, a constancia nos designios, e a inflexibilidade na administração da justiça
Entre as causas que espertaram o animo e brio dos portuguezes para se abalançarem á empreza dos descobrimentos, podem apontar-se como principaes: o desejo de dilatar a fé christã em todo o mundo conhecido; a sêde de gloria e de renome; a ambição de grangear fortuna conduzindo para o reino as especiarias, o ouro e pedras preciosas em que abundam as regiões orientaes; e a curiosidade de desvendar os segredos da natureza n'aquellas remotissimas paragens. E não se julgue que as navegações do seculo XV foram iniciadas sem plano, sem destino. Pelo contrario. Os nossos intrepidos mareantes levavam a sua rota já marcada, e não levantavam ferro sem se aperceberem de todos os conhecimentos e apparelhos necessarios ao cosmographo. A cultura intellectual do povo portuguez attingira o grau de desenvolvimento bastante grande para acompanhar o movimento scientifico e litterario das mais adiantadas nações da Europa, e com as suas viagens n'aquella época teve principio a historia verdadeira das navegações ao longo da Africa. Até ali tudo é vago, indeciso, fabuloso. Portugal estava mais proximo, que nenhum outro povo, do litoral africano; tinha já tomado Ceuta; dobrara o cabo Bojador; e sabia, em virtude da passagem do cabo da Boa Esperança, que existia communicação entre o Atlantico e o mar das Indias. Por tudo isto nutria no peito a generosa aspiração de levar o nome da patria e do filho de Maria aos paizes em que nasce a aurora. Tal era o desejo, a vontade nacional. Ora, sempre que um povo nutre uma idéa grandiosa, surge de entre a multidão um grande homem, o qual é—porque assim digamos—a personalisação do sentimento popular. Esse grande homem, esse representante da vontade unica de todos os portuguezes foi Vasco da Gama. Affirmam os chronistas que elle nasceu em Sines, e que teve por paes a Estevão da Gama e Isabel Sodré; e ainda que pouco escrevam, d'onde possamos inferir como correra a sua infancia e puericia, é comtudo facil presumir que principiou a sua carreira nos mares da Africa, e que sendo encarregado de negocios importantes, d'elles se desempenhou a contento do seu rei. A biographia de Vasco da Gama só é clara quando el-rei D. Manuel o escolheu para levar a cabo a empreza que sonhara. O facto de haver sido eleito pelo monarcha afortunado bem mostra que o Gama era navegante experimentado, e de animo feito e capaz de grandes cousas. E assim acontecia. Entre as qualidades que lhe adornavam o espirito, avultavam a energia com que exercia o mando, a constancia nos designios, e a inflexibilidade na administração da justiça